E se eu escolher não fazer parte disso? E se eu preferir não postar fotos
de biquíni, nem falsos sorrisos que se desfazem depois que a câmera emite o
flash? Posso preferir ser desconhecida e essa sim ser minha libido: passar
despercebida num mundo onde todos vivem em função de uma curtida. Quero ser do
contra. Ao invés de viajar para postar fotos e mostrar ao outros que tenho uma
vida interessante, quero viajar pra mim, e só pra mim, sem me preocupar com
fotos, ângulos, imagem ou corpo sarado. Quero poder apreciar a paisagem
tranquilamente, sentir a brisa tocar meu rosto e gravar tudo isso, não num
aplicativo que armazena a imagem por 24 horas, mas na memória que é capaz de
retomar as sensações sempre que eu quiser.
Quero ser diferente, sabe? Porque esse comum já excedeu. Num mundo de
batons, iphones, biquínis e saltos, quero me permitir a calça jeans, o tênis
sujo e o cabelo desarrumado. Quero não precisar participar de discussões on
line de temas polêmicos (tampouco ouvi-las ou lê-las). Quero ser eu mesma, do
jeito que eu sempre fui, do jeito que eu quero ser, e não do jeito que os
outros acham ou pensam que eu deveria ser. Quero usar o meu cabelo natural,
como ele é, e não ter que usá-lo liso, escrava da chapinha ou entupi-lo de
química, progressivas e falsas hidratações. Essa sou eu, entende?
Quero não precisar ser bonita o tempo todo, ser sensual para os outros ou
parecer inteligente ou intelectual para quem nem me conhece. Quer ser “humana”,
poder errar, poder chorar quando sentir vontade, me entristecer, ler autoajuda
(por que não?), mudar de opinião, se for necessário, e não ter que agradar aos
outros.
Quero poder me deitar à noite e saber que meu dia foi feliz porque o vivi
pra mim, não para os outros. Porque fiz o bem, não porque tenho muitos seguidores
no instagram. Quero antes de dormir, agradecer a Deus pela oportunidade de
evolução e crescimento, e não por ter conseguido boas fotos de um momento que
deveria ser só meu, mas que insisto em compartilhar com os outros para ter o
que contar. Quero, simplesmente, não ter o que contar, e ainda assim me sentir
feliz. Quero o simples e o essencial, para mim, e não porque ser minimalista é
moda. Quero ser vegetariana porque meu organismo e a minha consciência têm me
pedido e não porque parece chique.
Quero viver como vivia antes dessa explosão de ego. Em que eu podia ter
uma conversa sincera e feliz com um amigo sem precisar registrar o momento, em
que eu podia assistir ao por do sol despretensiosamente, em apanhar jabuticaba
no pé sem precisar postar que tenho um pé de jabuticaba no quintal de casa (o
que parece raro nos dias de hoje, felicidade a minha). Saudade da época em que
eu comia couve com angu feita pela avó e esse momento era nosso, só nosso.
Saudade da época em que nos reuníamos para tirar foto e esperávamos ansiosos
pela revelação de um momento nosso.
Saudade da época em que cada um vivia para si, não para os outros.
Saudade da época em que as pessoas eram felizes com tão pouco e os sorrisos
sinceros. Saudade da época da vida real, de pessoas reais e não desse desfile
de vidas ricas, interessantes, cheias de fotos nas redes sociais, mas tão
vazias de si, de sentido e de verdade.